terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Toda esta estrutura é uma roda-viva. [...]

Foto de Sandra Seitamaa na Unsplash


Toda esta estrutura é uma roda-viva. Estou completamente embrenhada nela. Talvez tenha encontrado o que aquela senhora deu a entender, uma grande ilusão. E, é a vivacidade desse momento que me vai recordando a dignidade de todos para encontrar algo verdadeiro e não um entretimento. Vou até à entrada. Abordo quem entra. A pessoa nem sequer me olha e seguro-a de frente, seguro os seus braços. Pergunto se quer entrar. Desvia o olhar, encolhe-se, não me responde, parece estar num estado de letargia. "Assume que queres entrar", peço. Não diz nada, acuso a sua fraqueza. Cá dentro, continuam a insana atividade. Decidem fazer uma barreira pouco depois da entrada, aumentam os desafios. Olho para uma jovem que cai primeiro, levantando-se quase imediatamente, mas com outros olhos, com outro movimento. Olhos inexpressivos, passos pesados. As pessoas dizem que as diversões não se tornam doença, mas começam, uma após a outra, a adotar a mesma atitude. Agem de forma mecânica, insensibilizada. Parece que não veem, nem ouvem. Parece que nem o seu pensamento se afasta da ideia de diversão. Saio, em pânico, para pedir ajuda. Vejo um senhor e exclamo: "eles estão lá dentro!" A estrutura está cada vez mais cerrada, as janelas diminuem, os portões quase fecham, mas há, ainda, passagem. Aquelas satisfações superficiais pareciam uma grande descoberta e parecia que nos tornava diferentes pelo prazer que proporcionavam. Mas, paramos, adormecemos, enfraquecemos, porque o descobrir é sempre novo, inesperado, verdadeiro, onde não entra o sonho no qual dizemos "encontrei, sou diferente!"

Raquel Loio, em O sábio, o diabo e a nascente (2022)

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